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16 fevereiro 2013

A importância da pesquisa

Tudo o que criamos tem alguma relação com experiências vividas ou referências acumuladas em nossa mente. Com o tempo, adquirimos tal conhecimento das formas que conseguimos reproduzí-las sem a consulta, mas ainda assim os mínimos detalhes escapam à nossa memória. Por exemplo: um exímio retratista não conseguirá fazer um bom retrato tendo como base unicamente a lembrança, ainda que o modelo seja conhecido.

Ora, se até com temas conhecidos precisamos do apoio de referências para o refinamento da forma, o cuidado é maior ainda quando se trata de um assunto novo, como acontece no processo de ilustração de um livro clássico. Não devemos representar um vestido, mas O Vestido; a roupa de uma Bela adormecida não pode ser similar à da Cachinhos Dourados, bem como o urso desta não pode ser igual ao urso polar de A Leste do Sol e a Oeste da Lua, e essas três histórias não poderiam se passar no mesmo lugar. 

A boa pesquisa dá veracidade à imagem que estamos produzindo, e base para a atmosfera que criamos; sem a realidade, a fantasia não tem sentido. Por esse motivo, valorizo muito o estudo e a conceituação em meus trabalhos. Pesquiso desde a aparência do solo até o tipo de vestimenta que a personagem porta, levando em conta a cultura do local, a época, classe social, etc. Até o menor objeto em composição possui sustentação no real.

Para ilustrar um conto, não me baseio exclusivamente na minha imaginação: busco referências no real para fundamentar minhas composições. Como exemplo, vou citar um pouco do que estudei para as ilustrações do livro A leste do Sol e a Oeste da Lua:

// composição
Devido à pesquisa prévia, a região em que a história se passaria estava determinada, então coloquei apenas as formas sugeridas de vegetação, mobiliário e vestimenta das personagens na etapa de escolha da composição. Definida a configuração espacial da ilustração, procedi com o refinamento das formas  agora, sim, com consulta de detalhes nas referências. 

Estudo inicial de composição

Estudo secundário de composição, refinado
Esboço quase finalizado de ilustração
// refinamento: vegetação
Por ser a representação da passagem da protagonista através de caminhos tortuosos em busca de um lugar quase onírico, escolhi uma floresta que transbordasse fantasia em suas formas. Trata-se de uma floresta temperada, então eu não poderia, por exemplo, colocar bananeiras e margaridas em meio aos pinheiros. A pesquisa foi feita desde a aparência do solo até as árvores de pequeno, médio e grande porte deste local específico. Misturei, também, a vegetação de outras áreas da Rússia para compor  pode-se fazer isto, desde que seja pertinente à ilustração e que permaneça crível.

Detalhe do esboço da ilustração finalizado e sua respectiva referência



//  vestimenta
A vestimenta tradicional russa foi projetada para enfatizar a dignidade interior da mulher, e o controle emocional. As peças não são apenas bonitas, como convenientes para que as mulheres pudessem trabalhar sem sentirem sua liberdade restringida. No campesinato, descobri que os trajes mais utilizados eram tecidos caseiros feitos com lona e lã, bordados ou com padrões geométricos, ou que remetessem à flora ou à fauna. 

As cores são sempre intensas, e a mais utilizada é o vermelho. A abundância de tonalidades desta cor em trajes de antigos mulheres russas pode ser explicada pelo fato de que o vermelho era a cor de proteção, de acordo com a superstição da época, e do fato de que havia inúmeros corantes naturais para cores marrom-avermelhadas. Além disso, a a palavra russa "belo" vem de "Krasny", termo russo para "vermelho".

Exemplos de vestimenta Russa
Exemplos de calçados pesquisados
Estudo da protagonista comparado com desenho que exemplifica a aparência 
da vestimenta "Rubaka", que era uma roupa mais comum aos camponeses.

Para a roupa da protagonista escolhi uma saia longa vermelha e bordada, camisão largo de tecido cru e calçados trançados.

Na primeira cena* eu utilizo o capuz, pois na cultura russa mulheres casadas não andam com a cabeça descoberta  faz sentido, portanto, colocar a protagonista com a cabeça coberta (não com adornos; deveria ser algo improvisado, devido ao fato repentino), pela promessa do casório. Após a quebra do encantamento na história, eu passo a representar a personagem sem adornos na cabeça, já que ela perde o posto de noiva.

[ *história completa do conto pode ser encontrada aqui]

Essa foi só uma pequena amostra da pesquisa que eu faço para ilustrar um conto, espero que tenham gostado! :)

04 fevereiro 2013

Modelo vivo

A prática do desenho de modelo vivo é indispensável na formação dos artistas. Meu interesse principal nessa atividade sempre foi refinar o traço para a área da ilustração, mas ela trouxe uma melhora considerável em todos meus trabalhos de design. Por esse motivo, dedico dois dias da minha semana aos estudos com modelo: um, no ateliê de Bandeira de Mello; o outro, na UFRJ, como monitora e aluna de Ary Moraes.

A técnica que mais me identifiquei foi o pastel seco. Em breve farei um post exclusivo para a técnica, mas abaixo vocês podem conferir alguns trabalhos que fiz com este e outros materiais, entre 2012 e 2013. Também discorro sobre a importância do estudo do desenho para o design.


Pastel seco sobre papel Mi-teints A2
Desenho feito em 2013
Carvão sobre Canson A1 (ainda em processo)
Desenho feito em 2013 no ateliê de Bandeira de Mello.

// design
Como monitora de desenho e modelo vivo pude perceber que, da mesma forma que todas as outras matérias obrigatórias, muitos alunos estão lá apenas para cumprir a grade. Desses, a maioria nem sequer gosta de desenhar (!). Verdade seja dita, para fazer design hoje em dia não é preciso ser o novo Leonardo da Vinci, mas o mínimo domínio do material é indispensável; é preciso conseguir passar uma idéia para o papel. O que sempre digo para meus alunos é que modelo vivo não é só uma questão de desenvolver a técnica do desenho, mas, principalmente, é para desenvolver nosso olhar. Como  Bandeira de Mello diria: "Não estou aqui para ensinar vocês a desenhar, mas para ensiná-los a ver". 

Em termos práticos, as aulas de modelo vivo melhoraram meus trabalhos de design em questão de composição, grid, proporção, modelagem da forma, equilíbrio, harmonia, cor, etc., e por isso acredito que ela seja indispensável para os jovens designers. Aos que querem ser ilustradores, então, nem se fala.


Pastel seco & conté sépia sobre papel Mi-teint
Desenho feito em 2013 no ateliê de Bandeira de Mello

Estudo a grafite no Sketchbook
 Feito em 2012 no ateliê de Bandeira de Mello

Pastel oleoso sobre papel Mi-teints A2
Desenho feito em 2013 no ateliê da UFRJ